Há histórias que precisam de ser partilhadas para de alguma forma inspirarem e ajudarem outras pessoas.
Hoje quero dar-vos a conhecer uma Mulher cheia de garra, apaixonada pela vida e que descobriu o seu grande propósito através do grave problema de saúde que teve no passado.
Esta é a história da Filipa:
” Foi há cerca de 10 anos que dei por terminada a minha bulimia, tinha 24 anos e andou de mão dada comigo durante 3 anos.
Sempre fui uma miúda que, apesar de vaidosa e cuidada, não ligava muito à balança. Relembro que naquela altura não existia instagram para acompanharmos a vida das nossas ideais.
No secundário, uma das minhas melhores amigas tinha passado por uma anorexia grave e eu vivi tudo aquilo intensamente sem saber que um dia iria passar por algo semelhante. Por isso, sim, desde cedo fiquei familiarizada com um assunto que era tabu pois segredava-se apenas. Estava por dentro de todos aqueles “esquemas” sórdidos e sujos que inventamos para perder peso rapidamente.
Quando comecei a faculdade estava acima do peso ideal mas longe, muito longe da obesidade. Como era “miúda” e o metabolismo era outro, se eu fizesse uns dias de ginásio e uma dieta rigorosa, perdia logo peso. Andava sempre em oscilações: ora magra a vestir o 36 ora mais “cheinha” a vestir o 40 (atenção meninas, eu não sou muito alta por isso vestir o 40 significa para mim alerta vermelho).
Num dia como todos os outros, subi para a balança e o choque foi grande, olho para o número das minhas calças e caio em mim, 44 como era possível? Pensei: “Mas que grande m****! O que posso fazer para perder peso rapidamente??”
As aulas da faculdade eram sempre de manhã, à tarde aproveitava para me refugiar em casa pois sentia-me muito mal com o meu corpo. Nada me servia, nada me ficava bem, estava muito acima do meu peso ideal e sair para mim era impensável.
Muitas eram as vezes que tinha crises de raiva pelo meu peso e comia bastante de uma só vez, sempre com o pensamento: mais um quilo, menos um quilo… não quero saber!
Em casa dos meus pais a alimentação era equilibrada para a época: se a mãe fazia um bacalhau com natas, lasanha, empadão ou arroz de pato tínhamos apenas uma saladinha a acompanhar. Comia sempre sopa mas não como as de hoje em dia. Quinoa, tempeh, tofu, arroz de couve flor eram coisas que na realidade não faziam parte da minha cozinha. Há 10 anos ou mais, não estávamos nesta fase em que comer saudável era tão promovido e comunicado em todos os meios de comunicação.
Lembrei-me, então, da minha amiga (a que tinha tido anorexia) e pensei: deixar de comer não consigo… então e seu comer mas logo de seguida começar a vomitar? Assim não engordo!
A primeira vez que experimentei foi horrível e senti-me muito mal. Pensava: “Que estúpida… onde tenho a cabeça? Que parvoíce…”.
Claro que voltei a fazer uma, duas, três, quatro vezes. Comia menos, como se estivesse de dieta para não dar nas vistas, e depois ia vomitar. Depois tornou-se um ritual. Ao início os meus pais não reparavam porque ir ao wc depois de comer era normal nem que fosse para lavar os dentes…
Mas o dia mais temido tinha chegado… A minha mãe descobriu e a partir daí instalou-se o caos.
A palavra Bulimia passou a ser a minha realidade e a minha família fazia parte dela. Entretanto eu já tinha perdido bastante peso e a magreza já era extrema mas continuava a induzir o vómito nos sítios onde os meus pais não conseguiam ter controlo.
Estava já, portanto, naquela fase dos esquemas e das mentiras e a minha mãe continua a alertar-me: “se não parares com isso levo-te ao médico e vais ser internada”. No pico da Bulimia não ouvimos ninguém, tornamo-nos egoístas e egocêntricos. Cada vez que ia vomitar pensava: “esta é a última vez. Prometo.” Mentira! Induzir o vómito tinha-se tornado tão fácil que eu fazia aquilo rapidamente e sem que as pessoas se apercebessem… Mas a minha mãe nunca consegui enganar (mãe é mãe e a minha é a maior… Devo-lhe tudo).
Foi então que passei a tomar os laxantes. Na minha pior fase da Bulimia eu estava a vestir o 32 de calças e estava largo. Estava a tomar diariamente 1 a 2,5 caixas inteiras de laxante. Comecei com 1 único comprimido mas deixou de fazer efeito e passei a tomar 2 comprimidos e assim sucessivamente até chegar a uma quantidade monstruosa. Tinha imenso frio de noite, de inverno era horrível. O meu cabelo caía muito, os desmaios eram constantes e a tensão sempre muito baixa. Quase não tinha menstruação, tinha crises de rins horríveis, entre muitas outras coisas. Foi assustador…
Entretanto fui obrigada a ir a uma médica especialista nestes casos de distúrbios alimentares e tinha de fazer um diário do que comia para lhe mostrar. Pesava-me, tinha apoio psicológico, tinha de ser controlada e isso era algo que me deixava triste, irritada e com mau feitio porque estava a fazer tudo isto contrariada e na minha cabeça nada fazia sentido. No meu entender os médicos não me compreendiam e eu achava que não percebiam nada daquilo. Para mim estava tudo bem, tudo controlado e nem me considerava magra para tanto drama à minha volta. Claro que a minha visão estava totalmente distorcida e não correspondia à realidade.
Mais tarde, foi-me receitada a Fluoxetina (aqui começa outra etapa). Sempre que me lembro do dia da primeira toma ainda me escorrem as lágrimas pelo rosto. Entrei em pânico só de pensar que isso me iria fazer engordar e que estava a perder todo o controlo. Lembro-me de abraçar a minha mãe e chorámos muito, prometeu-me que se eu tomasse a Fluoxetina, ela também tomaria comigo para perceber que não me iria fazer mal. Assim começou o lento processo de recuperação. Houve um clique naquele momento e não consigo explicar. Foi como se estivesse a conseguir ver, naqueles minutos em que a minha mãe estava a tirar os comprimidos da caixa, todo o mal que fiz a mim mesma, ao meu corpo, à minha saúde, aos meus pais, ao meu irmão, aos meus amigos e as lágrimas caiam-me. Só pensava: tenho tanto medo…
Tive muitas recaídas! Na verdade, olhando para essa fase da minha vida, sinto que estive num buraco muito fundo e escuro e que temos de aprender a sair de lá mas sozinhas! A ajuda que nos rodeia mesmo que seja muita e que nos faculte muito amor, apenas nos atira a escada, e temos de ser nós a querer subir os degraus caso contrário nunca conseguiremos.
Gradualmente fui aumentando de peso até chegar ao mais adequado para o meu organismo e estrutura óssea. Fui aprendendo a comer, continuei a ir às minhas consultas de nutrição e como tinha a sorte de ter a minha médica de família a viver na casa ao lado dos meus pais, tinha sempre muito acompanhamento.
No meio de tudo isto, terminei a minha Licenciatura e comecei uma nova etapa na minha vida: fui morar sozinha e comecei a trabalhar. Foi aí que tive de aprender a cozinhar e a conhecer melhor tudo o que envolvia a minha doença e a forma de recuperação da mesma. Nessa altura, era só eu e ela e não foi nada fácil porque esta nossa relação com o distúrbio alimentar é intensa e doentia, está sempre no nosso pensamento, mesmo quando começamos a melhorar.
Despertou aqui o meu gosto por conhecer melhor os alimentos e a perceber a diferença entre fazer uma dieta e ter uma alimentação saudável. Comecei a fazer as minhas compras de supermercado sozinha e a ler os rótulos das embalagens para saber o que estou a comprar e a dar ao meu corpo.
Do que gosto de comer? O que me faz engordar? Que alimentos posso conjugar para que eu me sinta nutrida e sem fome durante algum tempo? O que posso confecionar que me faça ter uma relação de amor pela comida em vez de uma relação de ódio? Teoricamente eu tinha as respostas para tudo isto devido a todo o acompanhamento médico e imensa informação transmitida.
Cresci, aprendi a gostar de mim, a tratar bem de mim e do meu corpo. Aprendi a comer sem culpa!Aprendi que me posso nutrir sem me punir! Apercebi-me com o tempo que cozinhar passou a ser um hobby e que funciona como terapia. Fui a workshops, tive aulas de cozinha particulares, estudei e ainda estudo muito sobre tudo o que envolva nutrição e alimentação saudável. Sempre através de informações válidas de bons médicos e bons nutricionistas que me rodeiam e/ou que eu acompanhe nas redes sociais.
Após dar por mim assumidamente recuperada de um distúrbio alimentar, e a fazer estas saladas, sopas, snacks, granolas, bolos… tudo saudável, sem açucares e sem coisas que nos façam mal à saúde e ao peso, comecei a pensar que talvez fosse possível ajudar mais pessoas nesse sentido e falar sobre este assunto que existe. Anorexia e Bulimia são reais e não devem ser tratados de ânimo leve pois fazem parte da nossa sociedade. São problemas reais e devem ser combatidos com histórias reais, apoio familiar, amigos, apoio profissional: médicos, nutricionistas, psicólogos.
Incentivada pela minha família e pelos meus amigos, criei uma página no Instagram onde posso colocar tudo aquilo que faço, partilhar receitas, fazer workshops mas o mais importante de tudo: dar a conhecer um pedaço desta minha história e mostrar como é importante para a nossa vida, corpo, e mente ter uma alimentação saudável.
O difícil hoje é conseguir mostrar que este projeto não teve início devido às tendências e moda das comidas saudáveis, mas que vem de trás. Existe uma história, existe um motivo, um porquê. Existe conteúdo tem amor, dedicação informação para passar, não é mais uma página de comida saudável só porque sim.
Nasce assim a CacauTerraMia, onde no Instagram podem ir vendo as receitas do meu dia-a-dia e muitas outras coisas. Na página online podem comprar os produtos que estamos neste momento a comercializar (com o tempo vamos colocando mais novidades), tudo sem açúcar, sem glúten e vegan friendly. Entretanto estamos a procurar um espaço físico de porta aberta, outro projeto que pode ser que se realize em breve.
Os envios são feitos para todo o país em 24horas (máximo 48horas dependendo das horas a que as encomendas são feitas). E é tudo acabadinho de fazer diretamente para a vossa casa, com produtos e ingredientes sempre frescos e da melhor qualidade. Espreitem o nosso instagram e a nossa página porque vai valer mesmo a pena”.
Instagram – www.instagram.com/cacauterramia/
Página – www.cacauterramia.pt/
Um beijinho grande
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